quinta-feira, 17 de abril de 2008

Papão

Tal como dantes só conseguia dormir com uma "luz de presença", hoje parece-me importante dar luz, de vez em quando, com um "beijo de presença". É que há quem ainda tenha medo do (outro) escuro..

7 comentários:

Benjamim Natura disse...

o poeta deixa de o ser quando dá luz. quando dá luz é um humano, e não um poeta, porque o normal é dar luz e ver o mundo lá fora, e não ser poeta. Os únicos poeta que dão luz, mas duma forma narcisista, porque fingem que são o mundo, ou porque fazem mundos oníricos, são os poetas das sensações (Caeiro, Campos, Sá-Carneiro, Cesariny, tantos nomes...) Deixemo-nos de tretas, o poeta é louco, ou gosta de fingir que o é, numa guerra interior de altivez ou auto-estima ("talvez para ser diferente,/ talvez para gostar de si"). E nada disto é condenável - há uma coisa que se chama Destino, e ainda que seja pirosa ou que se não acredite nela, o que é certo é que o poeta não sabe ao certo o que o faz ser poeta, o que o leva a fazer versos e tão pouco porque razão escolhe as palavras que escolhe e canta a voz que canta. Ignoto, quase e narciso são a trilogia do Ser Poeta.

E este texto é uma treta de um poeta, ou quase poeta, ou que finge ser poeta, e não é para ser levado a sério, meu caro pé partido, embora eu, não como humano, mas como poeta, acredite piamente no que escrevi!

Benjamim Natura disse...

o poeta é quase...
como queres que se defina?
é esse o seu problema

Benjamim Natura disse...

mas ser poeta é precisamente ser quase... é não chegar a ser seja o que for, nem mesmo poeta (porque é óbvio que a poesia não existe). Caro m&m, de pés assentes na terra, não é possível explicar, até porque o poeta finge não saber que lá fora, radiante, há o mundo, e com isto quero dizer que a contradição faz todo o sentido (o poeta é quase poeta), como uma forma de mostrar que é indefinível e que os poemas não passam de palavras unidas a que as pessoas chamam poemas, e que, assim, a poesia dá-lhes um prazer estético indefinível - e é aqui que quero chegar, com mais uma contradição - a definição de poeta é ser indefinível, é ser quase...
E apenas tomo como característica comum de todos os que se dizem poetas, e que só o são porque proporcionam experiências estéticas indefiníveis às pessoas, o narcisismo ou o fingimento do narcisismo (é uma necessidade ignota de, como narciso que o poeta é, mostrar a sua criação aos outros, "talvez para ser diferente" dos outros, "talvez para gostar de si")

(estou a gostar desta discussão, é bom saber que ainda há gente que pensa nestas coisas; faz-me pensar que não sou maluco)

Benjamim Natura disse...

então explica-me tu, também, meu caro, porque se considera poesia isto:

Os meus gatos
brincam com as minhas baratas

Adília Lopes

E se calhar já não se considera isto:

Olá, eu sou o Benjamim
E tenho a mania que sou poeta

Um poema?

Pura e simplesmente, o primeiro provoca uma emoção estética ao leitor, algo que é inefável, que se não define, mas que, por causa disso, não quer dizer que não exista.

Meu caro, não penses nestas coias com os pés assentes na terra, porque estamos a falar de arte, a forma de expressão humana mais elevada (a seguir à religião, segundo José Régio) e que é incompreensível às palavras, porque somos uns seres limitados e, assim, o que te estou a tentar mostrar é que o poeta não se define, e não que não existe. e o meu poema está a duvidar da sua existência (pelo menos em mim), como se a incompreensão do que é ser poeta destruisse esse "ser poeta", e não, de todo, a definir o poeta, porque a única definição possível é "quase".

Não sei se me expliquei bem o suficiente, mas não quero, de todo, que tenhas a minha opinião, antes apenas que a compreendas.

Benjamim Natura disse...

minha cara, só estava a tentar responder a "o poeta define-se? e aproveitar o dar luz do teu texto sem qualquer intenção de te chamar de poeta. e penso que a "o poeta define-se?" já respondi.

quanto a não se poder definir quem dá luz ou não, peço-te, então, que me digas um, um único poeta que seja, que só fale de coisas luzidias, que dê luz (e lembra-te, não conta os que, como narcisos que são, julgam que tudo parte deles, que são quase todos)? se me arranjares um exemplo, agradecia, mas, se não, olha, talvez eu tenha razão...

Benjamim Natura disse...

acho que estamos aqui com um problema de expressão, o que chamas de luz, eu chamo de prazer estético, que é aquilo que acho ser indefinível e que acaba por definir o poeta (indefinido, porque o que quer que seja que "mexa connosco" num poema é indefinido).
A luz de que falo é o amor à vida, o amor ao amor, falar do mundo sem qualquer mágoa, não falar da sombra, apenas da luz (quase como se "uma chiclet de banana" fosse "meramente uma chiclet de banana"), como se o prazer estético estivesse todo na Vida e no Amor e nessa Luz (não falo de beleza, já que, entre muitos outros, para Camões, a beleza dói).
O que vejo é que, em todos os poetas, há "um desejo absurdo de sofrer" (cesário verde); há "saudade de Deus" e "amor à morte redentora" (guilherme de faria); há um desejo de evasão, para amores puros à Camões, para amores desbragados à Garrett, para poeta-dramas à Pessoa, para não-ser à Antero, para a surrealidade à António Maria Lisboa...

Assim, minha cara, não um "minha cara" barato, mas um "minha cara" de respeito, porque não a conheço e não sei como tratá-la, talvez não estejamos em desacordo, o que tem uma certa piada, dada a discussão...

Benjamim Natura disse...

foram apenas alguns exemplos...
isto n ns leva a lado nenhum, porque também sua excelência se julga dona de toda a verdade e, por isso, nem vale a pena discutir.

apenas lhe digo que, para já, como não pôde compreender que, antes de generalizar, q nem sequer foi minha intençao primordial, o poema fala essencialmente de mim, e da minha maneira de me ver (como presumível poeta)?
finalmente, deixo-lhe aqui, escrito por um poeta a sério, a definição de poeta, não a minha, a de Milton Fornaro (um grande poeta uruguaio da actualidade) a falar do grande Ivo Machado, um dos nossos melhores poetas, açoriano, da actualidade: "Um criador a partir da palavra que cumpre a dificílima arte de, sem que o leitor dê conta, o fazer girar sobre si mesmo, para o deixar no mesmo sítio, transformado, diferente daquele que começou o caminho. (...) Os limos da palavra, por si só, não produzem poesia, por detrás está o poeta, o homem que dia após dia, se dobra sobre os sulcos aproximando-se até quasi tocar a terra com o rosto, protegendo cada rebento das impiedosas geadas que sem cessar se empenham em descer sobre os seres e as coisas. (...) Para mim, isso é poesia, o resto é escrever versos."

especial ênfase às impiedosas geadas...

falando por mim, a minha protecção contra as impiedosas geadas é escrever o que julgo ser poesia (embora duvide que seja realmente poesia, ou que seja boa) e, ainda que escreva com luz, não é realmente a luz, é um compromisso de luta contra as geadas (ninguém gosta de sofrer, acho eu).

Aqui tem o mais próximo de uma definição, que continua indefinida, e que não vale a pena discutir, a não ser que queira o pretensiosismo de ser dona das verdades do mundo. eu não sou, ninguém o é, e mais vale ficar sua excelência com a sua opinião e eu com a minha, sem qualquer ressentimento.

e, para terminar, deixo aqui um poema que dá luz - prazer estético - e não dá luz - vida, cor, amor, beleza, apoteoses,..., e compreendi, perfeitamente, que a luz que sua excelência apregoa é metaforica:

"AS PEDRAS

são caladas testemunhas
do tormento,

trazem sangue nas arestas da erosão
"IVO MACHADO